Passavam das
17h. Naquele dia, o frio estava mais intenso do que nos outros dias.
Olhei pela
janela da cozinha, algumas folhas secas chocavam-se com as outras, poucos se
arriscavam a sair de suas casas para jogar o lixo nas grandes latas colocadas
nas calçadas.
Ajeitei um
pouco mais o casaco contra o meu corpo, era hora de um café: pensei. Um
café quente para mim sempre foi sinônimo de colo e aconchego.
Há um tempo,
havia comprado uma pequena caneca esmaltada, de cor vermelha, com um pequeno
coador branco fixado a um suporte, dava apenas para uma xícara de café, porém,
para mim já era o suficiente. O gosto pelo café passado na hora, era muito
particular era como uma bênção na hora exata. A sensação era maravilhosa, pois
em instantes, a casa estava tomada por aquele aroma. Simplesmente incrível como
uma pequena caneca e um pouco de pó de café podiam rescender pela casa toda.
Sentei-me na
cadeira de frente para a janela da cozinha, entre um gole e outro, o aroma me
levou para longe e por um momento, em um piscar de olhos, pude ver a minha
querida mãe novamente, sentada ali comigo.
Foi dela que
adquiri o gosto pelo café passado na hora.
Nossas
conversas eram regadas a café e pão quentinho, com manteiga que derretia por
todo o pão.
Ficávamos
horas conversando, claro que a caneca e o coador eram maiores e de outro
material.
Ela com
frequência trazia sua cesta com novelos de lã, e sempre perguntava qual a minha
cor preferida.
- Para que
dessa vez, o que vai tricotar, mãe?
- Vou fazer um
gorro, os dias têm sido mais frios, e não quero você reclamando de sinusite,
(risos).
Eu apenas
revirava os olhos feito criança e bebericava mais um pouco de café, no canto da
boca um discreto sorriso, sentia a sensação de que era muito bom ser cuidada,
mesmo com a idade que eu já estava.
Entre um
ponto e outro, ela sempre olhava para a rua, para ver se o ônibus escolar já
estava por perto, meu filho, seu neto, já estava na terceira série do ensino médio,
o que significava que sua partida para outra cidade estava próxima. Ele iria
estudar fora e teríamos que romper o cordão umbilical, o que com certeza, seria
um pouco delicado.
- Mas como
está demorando o ônibus! Já são quase seis horas, o que a gente faz?
Ela esperava
pelo neto, ansiosamente.
Eu apenas
sorria, enchia mais um pouco a caneca dela com café e continuava a ver seus
pontos precisos, as agulhas se entrelaçavam rapidamente, dando forma a um novo
gorro rosa, com detalhes em verde, já que eu não havia decidido a tempo que cor
eu queria.
Eram tardes
agradáveis, sinto falta do cheiro do café daquela época, que com certeza,
possuía o sabor e aroma muito melhores, pois vinham com o aconchego de mãe.
O calor que
trazia o fogão à lenha para a casa, o aconchego à mesa, as conversas com a
minha mãe, são quase impossíveis de descrever. Sempre havia assunto, mesmo ela
saindo pouco, sendo mais reclusa, ela sabia de tudo e mais um pouco, era
incrível isso!
Talvez pelos
anos em que ela trabalhou à frente do armazém da família, é... talvez fosse
isso.
Olho para a
minha pequena caneca, o café já está no fim.
Penso em
fazer outro e continuar a divagar pelos anos em que eu conseguia ter a minha
companheira comigo, minha querida companheira de café e prosa.
Hoje, o som
dos ponteiros do relógio me ensurdece um pouco, ecoa não apenas pela casa, mas
em meu coração.
O ônibus já
não para aqui em frente de casa, os vizinhos já são outros e as árvores estão
secando.
Mas, apesar
de tudo o que o tempo vem me tirando, algo ele jamais irá conseguir, o aroma
daquele café que eu tomava na companhia de minha mãe.
Levantei e
coloquei mais água para ferver, pois seria bom continuar com as lembranças, que
o café me trazia.