Lembro-me daquele fim de tarde
O sol se punha devagar, dourando as
ondas do mar que salgavam a nossa pele.
Deitados sobre a areia, nada, naquele
momento, importava, os batuques feitos nos braços dos violões acompanhavam o
vai e vem das ondas que se quebravam sob nossos corpos, o céu estava limpo, a
lua enorme e brilhante. Tudo parecia tão perfeito, com um gosto de que nunca
iria acabar.
Famílias, amigos, colegas, namorados,
jovens apaixonados, todos reunidos, todos felizes.
Foi apenas um disparo, e tudo se quebrou
dentro de nós,
como se fôssemos feitos de cristal, o
cristal mais delicado e raro que há, aquele cristal que não há como colar, como
consertar, como refazer.
Acidental ou não, ele era apenas um
garoto, jovem, cheio de planos, cheio de sonhos e fantasias,
lembro dele correndo ao nosso encontro
quando chegamos. Pulava em nossos braços, entrelaçando suas pernas em nossas
cinturas, era tão típico dele aquele gesto, mas nunca nos cansávamos.
Moleque de riso fácil, de dentes
espaçados e olhos grandes, dois grandes círculos escuros que brilhavam ao lerem
histórias de Robin Hood, o herói que ele iria ser um dia, como ele tanto falava
ao fechar o livro em um estalo e pular de um sofá para outro, deixando sua avó
em polvorosa.
Apenas um disparo, e mais nada.
O coração já não batucava em seu peito,
seus olhos, tão lindos, vidrados em um lugar longe dali,
já não estava mais conosco, na verdade,
há tempos ele andava distante.
Tudo foi perdido junto com aquele
disparo.
Uma vez assisti a um filme, em um dos
trechos, a personagem dizia que quando uma mãe perde um filho, todas as mães do
mundo, perdem um pouco também.
E acredito ser verdade.
Ver aquela mãe debruçada sobre aquele
menino, salgando seu pequeno corpo com suas lágrimas,
levou um pequeno pedaço de cada um de
nós.
Não era para ser assim, era para ser
diferente
Tão jovem, tão inteligente, tão bonito,
tão esforçado.
Seria talvez um advogado? Um médico? Um
professor? Um cientista ou arquiteto?
Ou viveria em seu mundo dos sonhos até
despertar para a vida real?
Nada é mais ensurdecedor do que as
lágrimas de uma mãe que perde seu filho, as ondas continuavam indo e vindo, assim como nossos pensamentos.
Às vezes, eles quebram antes de chegar a
um destino final, às vezes, quebram sob nossos pés, às vezes, tentamos pegá-los,
mas eles fogem de nós... Assim como fugiu do mundo, aquele doce menino.
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