Na tarde de ontem uma senhora, a qual já é
minha freguesa de roupas, que doo a ela e aos filhos, veio saber se eu tinha
mais alguma peça, pois ela, às vezes consegue vender algumas para juntar um
dinheirinho a mais.
A filha adolescente veio junto, uma menina
muito bonita que se bem cuidada seria uma princesa. Ela me contou que no final
de semana haveria uma festa no salão do colégio para uma confraternização da
turma, porque os alunos iriam para outros colégios e outros ficariam sem
estudar.
Percebi que
ela estava querendo me dizer mais com a sua história, e por isso lhe
perguntei:-
-E você está animada com a festa?
Ela ergueu
seus lindo olhos cor de mel, e me respondeu:
- Eu gostaria muito de ir, mas nem sapatos
eu tenho, pois a mãe só compra tênis, que serve para a escola e outros lugares,
mas para uma festa não. As meninas estão se preparando há muito tempo, por isso,
nem penso mais no assunto.
Olhei para a mãe dela, que estava de cabeça
baixa, estava com vergonha do que a filha me contou. Acabei ficando sem graça e
lhe disse que iria tentar ajudar, pedi a ela que passasse em minha casa no dia
seguinte.
Fiz o impossível para conseguir algumas
roupas e sapatos, como não tenho filhos adolescentes, procurei uma amiga que
tem duas meninas da mesma idade dela. Minha amiga ouviu a história e se
comoveu, assim como eu. Acabei trazendo muitas roupas para a garota.
Na hora marcada ela chegou em minha casa.
Mostrei um lindo sapato, ela vibrou de alegria, aí fomos vendo as roupas. Tudo
ficou maravilhoso, então pedi a ela, que no dia da festa viesse pronta para
darmos um jeito no cabelo. Assim, no dia da festa ela veio com a mãe, estava
mais linda do que eu havia suposto que ficaria. O cabelo um pouco preso para
aparecer os brincos. Olhei a imagem dela refletida no espelho e minha mente
viajou para uns anos antes, dizem que devemos controlar nossas emoções, mas nem
sempre conseguimos, as lágrimas rolaram intensamente sobre o meu rosto, chorei
e soluçando pedi desculpas e um tempo para me recompor. Ela me perguntou o
porquê do meu choro tão sentido?
E, já mais
calma e sem chorar contei a história, que naquele momento voltara em minha
memória.
Eu fazia o
curso de magistério e a formatura era organizada durante os anos em que
fazíamos o curso, havia uma mensalidade para os gastos do dia da formatura, mas
nestes gastos não entravam vestido, sapato, acessórios e arrumação de cabelo. A
formatura era muito bem planejada, pois é um curso do qual saímos com diploma e
já podemos lecionar, depois de quatro anos somos professoras, o curso superior
vem após, mas muitas já estão trabalhando em escolas.
No dia marcado, haveria missa e, em seguida a
colação de grau, quando o pai acompanhava a sua filha. E lembro como se fosse
hoje, uma colega chorando na porta da igreja, quando ela chegou com o pai,
estávamos nos organizando para entrar na igreja em fila, e cada uma acompanhada
pelo pai ou pela mãe. Quando ela viu que todas estavam bem arrumadas, e todas
calçando sapatos pretos, ela soluçava, as nossas professoras foram tentar
ajudar, mas não houve jeito, e nem dava mais tempo para nada, ela e o pai
estavam de chinelos de dedo. Estavam bem arrumados, mas não tinham sapatos,
quem sabe se ela tivesse nos falado ou confiado em alguma colega, tudo estaria
arranjado, mas infelizmente o final foi triste, ela não quis entrar. Recebeu o
seu diploma em outro dia, na Escola.
Este fato
abalou a todos que ali estavam, jamais esqueci deste dia.
Quem sabe se ela confiasse e aceitasse que
outra pessoa arrumasse o sapato para ela, tudo ficaria bem. Sei que ela se
formou e estava lecionando, mas nunca mais a vi. Ainda me dói na alma o que
senti naquele dia da minha formatura. Éramos em duas grandes turmas e todas
ficaram sabendo do ocorrido e tudo seria diferente se ela tivesse um par de
sapatos, foi lamentável.