11 de fev. de 2011

Um Homem chamado Zumbi



Nunca saberei tudo, o pouco que conheço, o que aprendi e ensinei vieram dos livros, das linhas bem ou mal traçadas de muitos escritores do Brasil e do mundo.
Páginas amareladas com o tempo, guardadas em capas duras, com letras douradas nas estantes de minha casa.
Parafraseando Caetano Veloso: ‘’eu vi um homem correndo, por entre livros’’. Seus dedos corriam apressados por entre as linhas de Machado de Assis, Clarice Lispector, quadrinhos nos gibis, e até mesmo revistas com propagandas. Cena comum, talvez, se não fosse por um detalhe: seu nome é José Carlos da Silva Bahia Lopes, sua formação não ultrapassou o segundo ano do ensino fundamental, sua profissão atuante é catador de papel no lixão da cidade do Rio de Janeiro. 
Aos longos dos 25 anos de trabalho no lixão, o vulgo Zumbi, juntou e limpou mais de 10 mil títulos.
Sentado com seu filho ele lê histórias ao menino e faz sonhos como montar uma biblioteca para a comunidade.
Sua história é contada no documentário que concorre ao Oscar 2011, ‘’Lixo Extraordinário’’.
O que mais me encantou em suas palavras, em seu ato, foi a sensibilidade de um homem cuja vida nunca foi fácil, sempre tirou mais do que deu a ele, e, ao mesmo tempo, esse homem encontrou forças para continuar, para lutar, para educar seu filho, para sentar no sofá da sala e ler para seu menino, histórias que antes eram tão distantes ao mesmo.
Num mundo em que a desigualdade impera, onde uns têm muito, outros têm pouco, onde uns sentam-se em cadeiras e têm lápis e borracha, outros fazem bolachas de barro molhado para escapar da fome, surge para mim José Carlos da Silva, sonhador, batalhador, brasileiro, pai, homem, ser humano, leitor.
Penso comigo quantos têm a oportunidade de ser como esse homem, das formas mais fáceis que você possa imaginar, para muitos a vida já vem ‘’pronta’’, mas é jogada fora, levada à toa.
Olho para o lado, a TV ligada, no jornal é anunciada mais uma morte por tráfico de drogas. Jovens bem apessoados, algemados, sem valor algum de coisa alguma.
E em seguida, o homem José Carlos da Silva, com os olhos marejados, em meio a caixas de papelão citando frases dos seus autores favoritos.


É surpreendente o quanto a vida pode ser mágica como nas histórias encontradas nos livros. Em cada frase, em cada palavra, em cada ponto.
As ‘’caixinhas de surpresa’’, como os livros são chamados por Zumbi, encheram a alma desse homem de esperança, de que um amanhã virá e será melhor.
Essa é a função do livro, não fazer da pessoa um ser letárgico, ou colocá-la num mundo lúdico e mantê-la lá. A função do livro é trazê-lo para a vida, para que você saiba interpretar o que a mesma espera de você.
O livro nos ajuda, fala, ampara e escuta o que você tem a dizer, basta você estar pronto para doar-se a ele.
Zumbi, o catador, o homem batalhador, o bom pai, o bom filho, já está. E você?

Mariane Boldori




12 comentários:

  1. Olá, Marli
    Encontrei-a no Mimo Chic e senti desejo de conhecer o seu espaço.
    Vim e encantei-me!
    Tanto, que virei sempre...
    Sigo-a!
    Um abraço.

    ResponderExcluir
  2. Há sensibilidade no seu espaço, mestria no tratamento da palavra...Um belo naco de prosa...

    ResponderExcluir
  3. Marli, seus posts são fantásticos, parabens e obrigado por compartilha-los conosco :D
    ah, brigadão pelo comentário, fico muito feliz com eles.
    abração

    ResponderExcluir
  4. Oi, Marli, não tenho dúvidas que os livros e os animais são nossos melhores amigos: dos livros a gente tira sabedoria, sonhos e se prepara para enfrentar um mundo exigente, nos dá a possibilidade de criarmos um mundo melhor para vivermos; os animais nos acariciam, nos seguem, são companheiros até o fim de suas vidas.

    Realmente é lindo e penso que seja obrigação dos pais em incentivarem os filhos à leitura; não há maior legado. Porém ainda acontece pouco.
    Beijos, amiga.
    Tais Luso

    ResponderExcluir
  5. Muito bom o seu documentário.

    Bjs
    Isaías

    ResponderExcluir
  6. Zélia,seja bem vinda ao meu espaço e sinta-se a vontade para voltar sempre.Fiquei feliz com sua presença.Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  7. Luis Bento,que bom vê-lo aqui.Obrigada pela honrosa presença e palavras belas.Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  8. Andrébdois,obrigada.Faço minhas as suas palavras.Faz-nos bem ler os comentários que aqui são postados,pois é o impulso que recebemos para continuar.Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  9. Tais querida,quanta sabedoria em suas palavras,realmente o que registrou é real,porém falta tanto para sermos humanos sábios e bondosos.Obrigada pela presença que me deixa feliz.Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  10. Rodolfo,obrigada pelas palavras,seja sempre bem vindo.Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  11. Oi, Marli.
    Excelente o seu texto. Como bem disse Monteiro Lobato, "um país se faz com homens e livros".
    Um abraço ;)

    ResponderExcluir
  12. Olá Meias de Seda,realmente além do que disse Monteiro Lobato,posso acrescentar,O caráter de um homem se mede pelo amor que dedica aos animais.Juntamos tudo e teremos homens sábios e de bom coração.Obrigada pela visita e comentário.Um grande abraço1

    ResponderExcluir

A carta que nunca chegou

    Tarde cinza, vento forte fazia os galhos das árvores dançarem no jardim. Eu precisava finalizar a mudança que começara há dois anos,...