17 de set. de 2016

Certos dias...

E, naquele dia, ela só queria chegar em casa, tirar seus sapatos velhos e gastos e sentar-se no sofá.
A semana tinha sido daquelas em que quase nada dá certo, e a pessoa não sabe como seguir em frente,  parece perder as forças,
foi até a cozinha, ferveu um pouco de água, pegou um saquinho de chá de camomila, colocou na xícara, despejou a água,
a fumaça embaçou seus óculos.  

Olhou pela janela, a árvore balançava suas folhas como num balé, vezes arranhando sua janela convidando-a para dançar.
O sol já estava indo, na verdade, naquele dia, quase não aparecera, ficara entre nuvens, deixando o dia ainda mais cinza.
Pegou o açucareiro, despejou três colheres e mexeu, sem pressa, divagando ainda nas folhas que dançavam na árvore à sua frente
Voltou a se concentrar no momento, pegou a xícara, ligou a TV, sentou-se na poltrona.
Notícias trágicas não eram o que ela queria, foi percorrendo os canais, trocando-os aleatoriamente, porém, parecia que o mundo todo estava em guerra: mortes, assaltos, estupros, sequestros, bombas, tornados, furacões, ela só queria descansar os olhos.
Desligou a TV. Foi até a lareira, ajeitou alguns pedaços de lenha que ainda restavam, ateou fogo e voltou a sentar-se na poltrona com a sua xícara de chá. 

Entre um gole e outro, podia ouvir o som que o fogo causava enquanto queimava a madeira, de uma forma estranha trazia-lhe conforto,  fazia-lhe viajar no tempo e voltar para os dias de sua infância, quando, ali mesma, sentada no colo de sua mãe, enquanto ela lhe contava histórias, ouvia aquele  mesmo som.
Hoje, a casa ficara enorme e, mais vazia para ela. O som da madeira queimando era mais estridente, o eco propagava-se.
Olhou para cima, a escada de madeira levava para os cômodos e banheiros, antes ocupados pelos irmãos, avós e pais.
Hoje, trancado pois não precisava mais, de tantos cômodos.
Amizades que se perderam no tempo, parentes que foram embora, o o tempo passou tão rápido que ela não se deu conta de cuidar da sua vida, que ela não se deu conta de se preparar para a solidão que ela encararia, todos os dias, naquela casa enorme onde foi criada com tanto amor e tantas pessoas...
O chá havia acabado, sobrando apenas um pouco de açúcar no fundo e o saquinho, já ressequido. Ela olhou para a parede, fotos penduradas, lembranças emolduradas.
Sorriu sozinha e balançou a cabeça para espantar a lágrima que teimava em rolar por sua face.
Levantou-se, deixou a xícara na pia. Olhou pela última vez os galhos e as folhas da árvore ainda dançando. Do outro lado, um pequeno gato, com pelos manchados ou talvez sujos, miava enquanto olhava para os lados. Talvez, alguém o tenha abandonado e ele não sabia como voltar para a sua casa. 
Sentiu-se como aquele gato, perdida, solitária, pedindo por socorro sem ser notada. Abriu a porta da frente, abraçou-se ao próprio corpo, estava frio naquele fim de tarde. O gato não se moveu. Aproximou-se, abaixou-se, e acariciou sua cabeça. 
Levantou-se e voltou os passos em direção à sua casa.
Quando ia fechar a porta, ele voltou a miar, sentado em seu tapete de boas vindas.
- Entre, “senhor”! Venha aquecer-se comigo.
Ela iria pensar em um nome para o seu novo amigo posteriormente, agora só queria repousar e conhecer seu visitante. Na certeza, de que tudo vem na hora certa, e de que ela não estaria mais sozinha. 
O gato aninhou-se em seu colo, ronronando suavemente como forma de gratidão. 

Fotos: Google


16 comentários:

  1. Lindo ,doce, c0movente!Adorei! Que bom agora o senhor gato tinha uma amiga e ela companhia! Seriam felizes! bjs, chica

    ResponderExcluir
  2. Que lindo, chamou-me a atenção com esse belo conto, a vida tem disso, as coisas acontecem tudo de acordo com o que precisamos, é só saber ver, sentir e perceber!
    Amei ler, lindo e doce conto!
    Abraços amiga Marli!

    ResponderExcluir
  3. Texto bom! Reflexivo.
    beijogrande

    ResponderExcluir
  4. Belo e terno "naco de prosa". Não é raro uma certa solidão e nostalgia ocorrer a mentes menos novas. No entanto temos de encarar esses tempos como sucessão de fatos naturais da vida. Sempre pensando nas coisas boas que vivemos, ao mesmo tempo que vamos construindo bons exemplos de vida.
    Veja e comente o post
    Olinda Capital Colonial – Invasão de Pernambuco
    http://amornaguerra.blogspot.pt/
    BRASIL: SORRISO DE DEUS.

    Abraço

    ResponderExcluir
  5. Que linda história Teresinha!
    Tão solitária e o animalzinho chegou para lhe fazer companhia.
    Gostei muito.
    Bjs e um ótimo domingo.
    Carmen Lúcia.

    ResponderExcluir
  6. Adorável este texto! Amei

    Beijinhos e uma semana excelente.

    http://coisasdeumavida172.blogspot.pt/

    ResponderExcluir
  7. Há dias assim em que todas as solidões nos caem em cima. E não há como o silêncio para as redimir. O silêncio ou um gato...
    Um texto maravilhoso, minha amiga.Tão bem escrito que até me sensibilizou...
    Uma boa semana.
    Beijos.

    ResponderExcluir
  8. Um belo conto, Marli, em que a personagem solitária amarga a ausência de seus entes queridos, e que termina com o consolo que chega sem aviso, um gatinho, que tirou a sorte grande. Não haverá mais solidão para eles. Muito bom. Parabéns.
    Abraço.
    Pedro.

    ResponderExcluir
  9. Boa tarde, colega Marli!
    Adorei o texto e seu desfecho. Gatinho sortudo, uai! :)
    Ei, moça!
    Apareça lá em "GAM Dolls (2)" e encante-se com mais uma postagem supimpa. Venha ver a repaginada que dei em três figuras muito especiais.
    Ficarei feliz com sua visitinha e comentário, sempre tão gentis.
    Feliz Primavera e um abração pra você! :)

    ResponderExcluir
  10. Bom dia, lindo conto que comove e ao mesmo tempo encanta, está muito bem escrito.
    Resto de boa semana.
    AG

    ResponderExcluir
  11. Muito bonito e comovente...Ambos agora têm companhia.
    Um abraço. Élys.

    ResponderExcluir
  12. Lindo demais, comovente história, Marli! O que um bichinho pode fazer aos humanos é maravilhoso; e o que podemos fazer por eles, também. Um final feliz! Que esse teu belo conto ilumine algumas cabecinhas, que adotem os animais... Serão beneficiados.
    Beijo grande, querida amiga.

    ResponderExcluir
  13. 15/10 Dia do Professor

    Acróstico

    Das profissões esta é a mais nobre
    Início da primeira real noção
    Assim, que o aluno na aula descobre
    Dalguma dúvida a explicação.

    O professor nos mostra, descobre
    Põe sabedoria em cada questão
    Repete, explica e nada encobre
    Obtendo assim toda nossa atenção.

    Feliz dia! Ó mestre desprezado!
    Este Patropi nem lhe dá valor
    Suor e desprestígio é seu legado.

    Seja, por sequência, lá onde for
    O meu mais sincero muito obrigado
    Reconheço: do saber és portador.

    ResponderExcluir

A carta que nunca chegou

    Tarde cinza, vento forte fazia os galhos das árvores dançarem no jardim. Eu precisava finalizar a mudança que começara há dois anos,...